Certa vez os deuses estavam reunidos no Monte Olimpo deliberando sobre onde guardariam certo segredo.
Um dos deuses sugeriu o fundo mar. Mas outro deus contestou dizendo que no futuro o homem construiria equipamentos e chegaria até às profundezas abissais e descobriria o segredo. Outro deus sugeriu embaixo das montanhas: ─ Elas são muito pesadas, ninguém conseguirá levantá-las. Ao que um dos presentes discordou dizendo que no futuro alguém conseguiria cavar e descobriria o precioso segredo. Houve uma época em que nossos ancestrais exibiam suas pinturas nas paredes das cavernas. Num esforço não muito grande podemos imaginar aquelas pinturas sendo as ‘fotografias’ daquele tempo e as aquelas paredes como os corredores dos museus. Qual a diferença entre aquelas paredes e nossos museus? O que mudou de lá para cá foi a tecnologia e algum conceito cultural. Naquelas épocas eles desenharam e exibiram para o mundo suas caçadas, colheitas, suas histórias, seus hábitos. Não fazemos hoje a mesma coisa quando nos expomos nas redes sociais? Não são as redes sociais as paredes onde exibimos os lugares que visitamos, as festas que frequentamos, as pessoas que amamos?
Quero fazer uma analogia com a fotografia. Onde você guarda suas fotografias? Na parede para todos verem a qualquer momento? No álbum de família guardado na gaveta? Ou não as guarda? Ou são segredos que devem ser revelados apenas em situações especiais?
Assim como nossos antepassados gostamos de nos exibir, de contar histórias pela imagem. Quando exibimos nossas fotografias estamos compartilhando nossos segredos. O ato de mostrar ou não nossas fotografias vem precedido da pergunta: ─ Nossas fotografias são para nosso deleite pessoal ou para exibição pública?
Hoje nossas fotos estão nos aparelhos celulares e as levamos para onde desejarmos. As telas desses aparelhos mágicos não seriam as paredes do século XXI? Quem ainda não foi vítima daquele colega simpático que mostra as melhores fotos dele no aparelho de telefone? É como se estivéssemos num museu portátil com um guia a nos explicar a história e o significado daquela obra de arte digital. É a criatura exibindo a cria na rua, no metrô ou num encontro social.
Em vez de irmos até às paredes dos museus e galerias, os telefones celulares trouxeram-nas até nós. Mudaram-se as paredes e o conceito de fotografia... Não mudou a vontade de compartilharmos com os entes queridos uma bela obra de arte, ainda que digital. A alma do artista quer ouvir elogios sobre sua obra de arte. Não assim os jornais e revistas quando estampam na primeira página a foto mais emblemática do dia?
Se mostrássemos aos homens das cavernas as pinturas que eles fizeram, o que eles diriam? Creio que, com sorriso largo, contariam como foi aquela caçada, diriam que animal era aquele que está pintado, quais pessoas estavam naquela empreitada etc. Essas lembranças viriam à memória dele e ele nos contaria uma bela história. Afinal, não tendemos guardar a fotografia que nos cause dor. Ainda que tenhamos uma fotografia que dói, não é por conta da dor que ela está ali, é por causa do amor, amor à pessoa retratada. Amor àquela lembrança.
Não repetimos o mesmo hábito hoje? É para contar nossas histórias que colocamos nossas fotografias nas paredes dos museus, de nossas casas e nas redes sociais. E sempre colocamos as boas histórias. Quantos de nós já colocaram uma história ruim nas redes sociais? Afinal, o que nos traz tristeza tendemos esconder nalgum lugar inacessível.
Aliás, voltando à reunião dos deuses... Foi então que Zeus, o rei dos deuses, decidiu esconder o segredo no coração do homem: ─ Este é o lugar onde ninguém conseguirá penetrar.
Brasília-DF, João Rios Mendes, 29/09/202
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